8.5.10

"Soraia"; The Whiter Shade of Pale

"Soraia" será meu primeiro livro consistente, escrito em primeira pessoa, apesar de suas primeiras fatias, no blog, estarem escritas na terceira. Leia uma fatia/ rascunho dele em Soraia (esboço), e no final de "Pronta para a vida" (parte da cachorrinha; primeiro post).

...........................................
Belíssimo:

We skipped the light fandango
Turned cartwheels across the floor
I was feeling kind of seasick
But the crowd called out for more...


7.5.10

Soraia (esboço/ mudando, inacabado)

Quando Octávio alisou-lhe o pulso com sua espada de esgrima clássica, Soraia reviu-se criança, vestindo-se de anjo para acompanhar a Maria Madalena na procissão de Semana Santa, "Está linda, mas vista um agasalhinho por baixo da túnica, para não sentir o gelado do cetim", "Não, a túnica é mais linda sem agasalho por baixo"; armazenando todas as suas lágrimas infantis em tacinhas, como uma pequena oferenda, desde que soube que um santo o fizera; estudando com energia. Lindíssima, frágil, esnobe, forte. Octávio nunca a compreeenderia, tampouco seria complacente com ela, como quando era uma criança de cinco anos e a família soube que a amiginha a unhara impiedosamente na piscina por causa de um pouco de filtro solar, "Não empresto meu filtro, Heleninha, porque você tem!".

6.5.10

Fluxos da consciência

Reflexão adicionada à "Naveta de prata", agora "Pronta para a vida". Leia-se!

E, de uma cartilha antiqüíssima:

"__ Bonequinho Doce, de onde vieste?
__ Do moinho!
__ Que trouxeste?
__ Pão e vinho!
__ Me dá um pouquinho?"

De Marguerite Duras (não a li em francês, mas em português e inglês, e achei-a mais linda em inglês):

"Hélène Lagonelle’s body is heavy, innocent still, her skin’s as soft as that of certain fruits, you almost can’t grasp her, she’s almost illusory, it’s too much. She makes you want to kill her, she conjures up a marvelous dream of putting her to death with your own hands. Those flour-white shapes, she bears them unknowingly, and offers them for hands to knead, for lips to eat, without holding them back, without any knowledge of them and without any knowledge of their fabulous power. I’d like to eat Hélène Lagonelle’s breasts as he eats mine in the room in the Chinese town where I go every night to increase my knowledge of God. I’d like to devour and be devoured by those flour-white breasts of hers.
I am worn out with desire for Hélène Lagonelle.
I am worn out with desire.
I want to take Hélène Lagonelle with me to where every evening, my eyes shut, I have imparted to me the pleasure that makes you cry out. I’d like to give Hélène Lagonelle to the man who does that to me, so he may do it in turn to her. I want it to happen in my presence, I want her to do it as I wish, I want her to give herself where I give myself. It’s via Hélène Lagonelle’s body, through it, that the ultimate pleasure would pass from him to me.
A pleasure unto death."

20.4.10

As bailarinas

A pequena bailarina, tocada pela música,
vive o instante breve da dança.
Ao seu redor, outras,
leves e pequeninas,
equilibram-se nos fios tênues do poema.
São quase trapezistas, as bailarinas,
e já não dançam apenas!
Buscam morada luminosa no balé.
Na música elas buscam
calmarias, lembranças,
tempestades, trapézios,
como pássaros brancos indo encontrar seus caminhos.

P.S.: Poema escrito há oito anos.

18.4.10

Memória

Nas minhas festas de aniversário de criança, havia alfenins brancos e rosas em bandejas de prata. Quando novamente me delicio com um alfenim e sinto o seu retorcido delicado, como nó no cabelo da menina que não se penteia, pois a boneca a reclama imperiosamente, quando novamente quebro um nos dentes, como quem prova a madeleine que ressuscita a memória, tenho, de volta, os lençóis imaculados, o crivo da avó e as lágrimas preciosas da infância __ que eu, quando menina novinha, quis conservar numa tacinha, como ouvi dizer que fez um santo __ sobre a minha mesa.

P.S.: 0 alfenim, que o povo também chama alfeninho __ do árabe al-fanid __ é, na definição de Luís da Câmara Cascudo, uma massa de açúcar, seca, muito alva, vendida em forma de flores e outras...
Receita de alfenim, Dicionário do doceiro brazileiro (3a ed.), Rio de Janeiro, J.G. Azevedo Editor, 1892:
"Toma-se um quilograma de calda na qual se lança uma colher de vinagre branco, ou meia colher de geléia de fruta azeda. Leva-se ao fogo e quando estiver no ponto de quebrar, deitam-se algumas gotas de óleo essencial de flor de laranjeira ou qualquer outro que se prefira. Tira-se, então, do fogo, derrama-se sobre uma mesa de mármore e deixa-se esfriar até se lhe poder pegar com as mãos. Toma-se então um bocado, e principia-se a estender como em fio, separando as mãos, tornando a puxar, estendendo, e repetindo isto até que a massa esteja branca prateada, e que, reunidas, as pontas do fio não se ajuntem em massa. Neste caso se desfia em fios delgados que se dobrarão, estendem-se, sobre o mármore, e cortam-se do tamanho que se quiser. Essa operação deve ser feita com rapidez e, portanto, por duas ou mais pessoas, para que a massa não arrefeça. Essas preparações podem ser coradas e, então, a matéria corante em pó se junta ao estender a massa, logo em princípio, porque pela repetição desta operação se mistura por toda a massa igualmente".

16.4.10

Pronta para a vida

Na madrugada de hoje, assisti a um programa de televisão que mostrava a festa de aniversário, repleta de personalidades como Nélida Pinõn e Lygia Fagundes, da ex-manequim Beth Lagardère. Nélida fala do sentido de celebração da ex-manequim, e que, uma vez indo à casa de Beth para entregar-lhe a Medalha Euclides da Cunha, da ABL, foi recebida por aquela mulher generosa e iluminada, adentrando a sala vestida para festa. Mas não havia ali bolo ou fotógrafos. Nélida conclui, linda, que uma mulher assim, como Beth, é uma mulher pronta para a vida.
Sim, ela é!
Beth Lagardère tem uma tiara de cabelo branco perto da testa. Os fios apareceram quando o marido adoeceu gravemente, e ela conserva-os na viuvez, como quando se é Maria Madalena na Semana Santa de uma cidade do interior de Minas, se sai às ruas ricamente vestida, carregando uma naveta de prata, e, depois, se guarda a naveta; como quando se é a criança esbelta que celebra o nascimento da cachorrinha nova devorando, encurvada, um pote de geléia de mocotó, e, anos à frente, já mulher, não pode viver sem a geléia em casa __ a cadelinha nova, ela tinha de batizá-la Nova, pois era tão nova e fresca, que ela, criança, soluçava encantada, "nova, Nova!", depois, teria de cortar-lhe as patinhas que cresceriam, o animalzinho sempre na altura de seu tornozelo.
Assim fez Beth com sua vida. Beth Lagardère me lembra Clarissa Dalloway. Uma mulher pronta para a vida!