20.4.10

As bailarinas

A pequena bailarina, tocada pela música,
vive o instante breve da dança.
Ao seu redor, outras,
leves e pequeninas,
equilibram-se nos fios tênues do poema.
São quase trapezistas, as bailarinas,
e já não dançam apenas!
Buscam morada luminosa no balé.
Na música elas buscam
calmarias, lembranças,
tempestades, trapézios,
como pássaros brancos indo encontrar seus caminhos.

P.S.: Poema escrito há oito anos.

18.4.10

Memória

Nas minhas festas de aniversário de criança, havia alfenins brancos e rosas em bandejas de prata. Quando novamente me delicio com um alfenim e sinto o seu retorcido delicado, como nó no cabelo da menina que não se penteia, pois a boneca a reclama imperiosamente, quando novamente quebro um nos dentes, como quem prova a madeleine que ressuscita a memória, tenho, de volta, os lençóis imaculados, o crivo da avó e as lágrimas preciosas da infância __ que eu, quando menina novinha, quis conservar numa tacinha, como ouvi dizer que fez um santo __ sobre a minha mesa.

P.S.: 0 alfenim, que o povo também chama alfeninho __ do árabe al-fanid __ é, na definição de Luís da Câmara Cascudo, uma massa de açúcar, seca, muito alva, vendida em forma de flores e outras...
Receita de alfenim, Dicionário do doceiro brazileiro (3a ed.), Rio de Janeiro, J.G. Azevedo Editor, 1892:
"Toma-se um quilograma de calda na qual se lança uma colher de vinagre branco, ou meia colher de geléia de fruta azeda. Leva-se ao fogo e quando estiver no ponto de quebrar, deitam-se algumas gotas de óleo essencial de flor de laranjeira ou qualquer outro que se prefira. Tira-se, então, do fogo, derrama-se sobre uma mesa de mármore e deixa-se esfriar até se lhe poder pegar com as mãos. Toma-se então um bocado, e principia-se a estender como em fio, separando as mãos, tornando a puxar, estendendo, e repetindo isto até que a massa esteja branca prateada, e que, reunidas, as pontas do fio não se ajuntem em massa. Neste caso se desfia em fios delgados que se dobrarão, estendem-se, sobre o mármore, e cortam-se do tamanho que se quiser. Essa operação deve ser feita com rapidez e, portanto, por duas ou mais pessoas, para que a massa não arrefeça. Essas preparações podem ser coradas e, então, a matéria corante em pó se junta ao estender a massa, logo em princípio, porque pela repetição desta operação se mistura por toda a massa igualmente".

16.4.10

Pronta para a vida

Na madrugada de hoje, assisti a um programa de televisão que mostrava a festa de aniversário, repleta de personalidades como Nélida Pinõn e Lygia Fagundes, da ex-manequim Beth Lagardère. Nélida fala do sentido de celebração da ex-manequim, e que, uma vez indo à casa de Beth para entregar-lhe a Medalha Euclides da Cunha, da ABL, foi recebida por aquela mulher generosa e iluminada, adentrando a sala vestida para festa. Mas não havia ali bolo ou fotógrafos. Nélida conclui, linda, que uma mulher assim, como Beth, é uma mulher pronta para a vida.
Sim, ela é!
Beth Lagardère tem uma tiara de cabelo branco perto da testa. Os fios apareceram quando o marido adoeceu gravemente, e ela conserva-os na viuvez, como quando se é Maria Madalena na Semana Santa de uma cidade do interior de Minas, se sai às ruas ricamente vestida, carregando uma naveta de prata, e, depois, se guarda a naveta; como quando se é a criança esbelta que celebra o nascimento da cachorrinha nova devorando, encurvada, um pote de geléia de mocotó, e, anos à frente, já mulher, não pode viver sem a geléia em casa __ a cadelinha nova, ela tinha de batizá-la Nova, pois era tão nova e fresca, que ela, criança, soluçava encantada, "nova, Nova!", depois, teria de cortar-lhe as patinhas que cresceriam, o animalzinho sempre na altura de seu tornozelo.
Assim fez Beth com sua vida. Beth Lagardère me lembra Clarissa Dalloway. Uma mulher pronta para a vida!